PALAVRAS DE VIDA:

"Sejam bons administradores dos diferentes dons que receberam de Deus. Que cada um use o seu próprio dom para o bem dos outros!." 1 Pedro 4:10

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Dança Bob, Dança.

Quando chega a quinta-feira, dia da única reunião pública do campus, Bob é sempre o primeiro que vejo sentado na quadra de basquete. Ele é alto magro e desengonçado, usa o cabelo cortado curto e um bigode aparado. Bob mora na rua. Muitos já tentaram trazê-lo ao abrigo do governo mas ele não parece se importar com não ter teto. Bob dança na adoração como uma criança. Balança os longos braços de uma lado para o outro como asas, flutua como uma garça acima das intempéries, usa a lucidez, não sei se plena ou fugaz, para entender as mensagens e comentá-las depois com todos que se dignam a lhe dar ouvidos.

Num lugar como este onde vivo, um caleidoscópio de faces de nações diferentes, Bob é mais um diferente. Na multiplicidade cultural a diferença se torna o ponto em comum. Unidos porque não somos iguais nos toleramos e aceitamos. Bob recebe o amor da comunidade, comida nas ruas, a possibilidade de um abrigo se quiser mas não recebe pressão para não ser Bob.
Um filme que mostra esta missão do encontro muito bem é O Soloísta (2009). Nathaniel (Jamie Foxx) é um homem de rua, que tocava violoncelo na prestigiada escola Juliard em Nova York, antes de ter um surto esquizofrênico que o jogou na rua. Steve Lopez, (Downey Jr.), o jornalista o encontra e o torna personagem de suas crônicas diárias no jornal LA Times. O encontro se torna mais do que um mero tema de trabalho para Steve Lopez, que abraça o desafio de entender Nathaniel e ajudá-lo a recuperar um pouco do que perdeu. Um padre, professor de música também se aproxima de Nathaniel para lhe dar aula de cello mas a missão oculta do padre é evangelizá-lo. Quando o músico entende a missão do padre, ele diz:
“Não preciso de Deus, eu já tenho um. Você é meu deus, Steve Lopez.”
Assistindo e reassistindo ao filme este momento sempre me leva às lágrimas. O agnóstico ateu entendeu amor incondicional. O padre, assim como nós evangélicos sempre o fazemos, não. A intenção oculta de “evangelizar” o pagão nos conduz muitas vezes para longe dele. No esforço de catequizar, proselitar, salvar, nos perdemos. Quando conseguimos amar sem pedir nada em troca aí revelamos a Deus. O Deus que se oculta na religião, brilha no encontro.
Steve Lopez não queria proselitar Nathaniel, queria vê-lo. Neste processo o jornalista solitário encontra na arte do louco de rua a sua própria redenção como ser humano. O amor nos conduz à entrega, e à uma luz nova sobre nós mesmos. Somos iluminados pelos que amamos, assim como ele nos ilumina. Quando Bob dança perto de nós como uma garça, nos damos o direito de perder a compostura e sermos mais soltos.
Este evangelho que chega ao nosso “infinito particular” é desejado por todos. Desejamos um romance eterno com o outro que nos aceite definitivamente. Queremos ser felizes para sempre. Este desejo humano de romance é um reflexo do que precisamos receber se houver um Deus que por acaso nos ame.
Desejamos um Deus que nos enxergue, que nos retrate que nos leia porque não somos difíceis de ler. O Deus bíblico parece não ter problema com isto. Ele se encontra com Faraó num espetacular aparato político religioso, com Moisés numa rocha, com o profeta Elias numa brisa, com a mulher de Samaria numa bilha de água, com um cego num maçaroca de lama e cuspe. Deus-Jesus não tem medo de chegar onde estamos.
Minha amiga Baby do Brasil me contou que assim que se tornou evangélica recebeu telefonemas e visitas de celebridades evangélicas que queriam lhe instruir em como ser transformada. Esta transformação era principalmente na aparência. Baby com a graça que lhe é peculiar ouvia, recebia os terninhos de casaquinho e blusinha próprias para uma pastora, mas nunca teve um momento de dúvida sobre quem era, e sobre quem era o Deus que servia. “Eu conheço meu Jesus. Ele me ama assim como sou… de botas e roupa de roqueira radical…”
Muitas vezes convivendo com ela eu a via tão livre em Deus que ficava insegura. E se, esta liberdade toda se transforma em libertinagem? E se ela não entende o compromisso moral que Deus requer de nós? Mas Baby porque amada, ama, porque é aceita é transformada por Ele. O amor não funciona contra a reforma moral mas à favor dela. Não abandonamos o pecado para encontrar o amor. Mas por causa do amor se torna possível abandonar o pecado.
Me encontrei com um rapaz que trabalhou conosco, depois de um ano que ele havia vindo embora. Ele quis nos ver a mim e meu marido para confessar uma série de coisas erradas que havia feito enquanto estava conosco. Quando lhe perguntamos se estava então andando com Deus, e por isto queria confessar, ele disse:
- Não. É que o que fiz enquanto estava com vocês me dói mais do que o que fiz em qualquer lugar. Porque vocês realmente acreditaram em mim.
Este rapaz me ensinou que o sucesso em Deus que devemos buscar é o de sermos capazes de amar com amor incondicional. Só este amor e mais nada tem o poder de conduzir pessoas ao verdadeiro arrependimento.
Neste momentos de crise moral no Brasil me pergunto, se como corpo evangélico estamos conseguindo comunicar para o país uma mensagem de amor. Ou se a nossa mensagem, como quase que invariavelmente acontece na religião instituída, diz ao povo brasileiro, aos gays, aos maconheiros, aos macumbeiros, aos pagãos, que eles não são bons o suficiente para serem amados por Ele.
Dança Bob, dança. Dança na presença d’Ele e na nossa.

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Extraído do Blog de Braulia Ribeiro.
Missionária em Porto Velho, RO, e presidente da JOCUM – Jovens com Uma Missão.

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