A
palavra de Jesus tem de ser levada a sério. Ele é o Senhor da seara e o Senhor
da Igreja. Ele conhece o passado, o presente e o futuro. Conhece a serpente de
Gênesis e o dragão de Apocalipse.
A
certa altura de seu ministério terreno, Jesus entrou em um barco à margem do
lago da Galileia, sentou-se e contou a parábola do joio. Nessa parábola, ele
denuncia o inimigo sem nome que se aproveita do sono daqueles que de dia
semearam o trigo. O inimigo semeia no mesmo campo outra semente, a semente do
joio, cuja planta não produz nada prestável, senão lenha para o fogo. Por meio
desta pequena e simples parábola, Jesus explica como será a história do anúncio
do evangelho. Enquanto o tempo da parúsia não chegar, haverá sempre duas
semeaduras praticamente simultâneas: a semeadura da boa semente (o trigo) e a
semeadura da dúvida, dos equívocos e da confusão (o joio). Jesus queria que
todos soubessem disso e interpretassem a história do cristianismo por esse prisma.
Excelentes
semeadores do trigo, a começar por Paulo, espalharam a boa semente em todo o
continente europeu -- da Península Ibérica ao mar Cáspio e dos países
mediterrâneos aos nórdicos. E se a Europa hoje está cheia de templos cristãos
que já não são usados para louvor e adoração, mas para atrair turistas, isso se
dá, em última instância, porque excelentes semeadores do joio seguiram o rastro
e o itinerário dos semeadores do trigo e depositaram no campo a má semente.
Os
semeadores do trigo são aqueles que pregam o evangelho puro e simples. Aqueles
que espalham as boas notícias em torno do nome de Jesus. Aqueles que não
escondem nem omitem a eternidade de Jesus (“o Verbo estava no princípio com
Deus” e “sem ele nada do que foi feito se fez”), o nascimento virginal de Jesus
(“O Verbo se fez carne”), a morte vicária de Jesus (“Eis o Cordeiro de Deus que
tira o pecado do mundo”), a ressurreição de Jesus (“Não era possível que ele
fosse retido pela morte”), o triunfo de Jesus (“Deus o exaltou sobremaneira e
lhe deu o nome que está acima de todo nome para que diante dele se dobre todo
joelho e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor”) e a volta de Jesus
(“Todos verão o Filho do homem vindo sobre as nuvens do céu com poder e muita
glória”) (Jo 1.1, 29; At 2.24; Fp 2.9-11; Mt 24.30).
Os
semeadores do joio são aqueles que negam que Jesus é o Cristo divino (1Jo
2.22). Aqueles que diminuem a glória e o poder do Criador e aumentam a glória e
o poder da criatura. Aqueles que tiram Deus do centro e do altar para se
colocarem ali. Aqueles que humanizam a pessoa divina e divinizam a pessoa
humana. Aqueles que despem o ser humano do seu conteúdo metafísico espiritual e
contemplativo e o deixam em um vazio insuportável. Aqueles que cavam cisternas
rachadas e enchem de terra os rios de água viva. Aqueles que constroem uma
antropologia secular, uma hamartiologia secular, uma cristologia secular, uma
soteriologia secular e uma escatologia secular. Aqueles que pregam uma
liberdade sem sabedoria, sem virtude e sem Deus. Aqueles que apresentam um Deus
sem ira, um homem sem pecado, um reino sem julgamento e um Cristo sem cruz,
como denunciou o teólogo H. Richard Niebuhr (1894–1962).
Graças a
esses semeadores do joio, o ideal de cristandade que havia predominado na Europa
por quase um milênio e meio tem arrefecido. No auge da Revolução Francesa
(1789–1799), a Catedral de Notre Dame recebeu um novo nome: Templo da Razão.
Pouco tempo depois, em menos de trinta anos, duas biografias de Jesus
questionaram o Jesus da Bíblia: em 1835 foi a vez de “Leben Jesu”, do alemão
David Strauss
(1808–1874)
e em 1863, de “La vie de Jésus”, do francês Ernest Renan (1823–1892).
A
nota alvissareira é que, no auge dessa confusão, o pouco conhecido semeador do
trigo Edward Perronet (morto em 1792) publicou, em abril de 1780, na revista
“Gospel Magazine”, o hino talvez mais solene sobre a glória devida a Jesus:
Saudai o
nome de Jesus! / Arcanjos, adorai!
Ao rei
que se humilhou na cruz / Com glória coroai!
Ó,
escolhida geração / De Deus, o eterno Pai,
Ao
grande autor da salvação / Com glória coroai!
Remidos
todos, com fervor, / Louvores entoai!
Ao que
da morte é vencedor / Com glória coroai!
Ó,
raças, povos e nações / Ao rei divino honrai!
A quem
quebrou os vis grilhões / Com glória coroai!
Extraído de: www.ultimato.com.br - Edição: 337
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